quinta-feira, 7 de outubro de 2010

“A sociedade sem história não é nada”

Loide Caetano, coordenadora do Museu da História de Maringá, defende a importância da conservação da memória 
Alisson Gusmão
 Em meio a uma tarde de maio, com um sol típico de outono e o vento fresco soprando por entre as estruturas físicas do centro universitário, que um compromisso planejado estava prestes a se cumprir. A entrevista estava marcada para 15h, no local planejado, o Cesumar (Centro Universitário de Maringá). Para chegar até a sala combinada era preciso transitar por entre as famosas bibliografias contidas na biblioteca do campus. O andar era o 2º e a sala, uma bem no final do corredor, escondida ao lado de outros dois escritórios, que bem podia ser comparada a um cofre, pois mantém o resultado de um trabalho intenso de desvendar as histórias passadas do município de Maringá.
A entrevista era com a professora Loide Caetano, graduada em História pela UEM (Universidade Estadual de Maringá) e mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Bernardo do Campo. Pelo Cesumar, ela exerce o cargo de coordenadora e responsável em por em prática os trabalhos do Museu da História de Maringá.
Após alguns minutos, a entrevistada chega e com apenas um sorriso e um cumprimento faz toda a tensão do momento dar lugar a uma conversa calma, para o início de um breve resgate da memória ou uma completa aula de história.

Loide Caetano, a casa do colono e as obras do museu histórico 


A senhora é graduada em história e mestre em ciências da religião. Por que essa escolha e como é seguir esse rumo de estudos?
A escolha do curso de história foi pelo prazer mesmo, porque eu gostava. Eu entrei na faculdade tardiamente, já tinha 32 anos, e na época pensei em optar por pedagogia ou até mesmo direito, que são áreas também interessantes, mas preferi história mesmo. Eu tive uma professora, uma freira alemã, no primário e nos primeiros anos do ginásio. Ela nos ensinava de uma forma muito gostosa e eu aprendi a gostar de história por causa dela. E ciências da religião eu decidi quando fiz a minha graduação. Tinha um projeto de pesquisa que seria o de conclusão de curso e era sobre a história da Igreja Presbiteriana aqui da região de Maringá, mas quando eu fui procurar um orientador, não houve esse interesse pelo meu objeto de pesquisa. Eu até sinto que eles acharam que não era um tema interessante. Aí eu guardei esse projeto e pensei em fazer o meu mestrado em uma instituição que ‘puxasse’ para esse lado religioso, então eu fui para a Universidade Metodista, de São Bernardo do Campo. Meu orientador foi um dos expoentes da Sociologia no Brasil, saudosa memória do professor Mendonça.
Qual a importância e contribuição do resgate da conservação histórica da sociedade?
Uma sociedade que não preserva a sua história, a sua memória, não tem identidade, porque a gente não cai de para-quedas. Olhe, por exemplo, o Cesumar, aquilo que era, como o professor Wilson [Matos – reitor] sempre fala: um lixão. De repente é essa maravilha aí. Agora, se a gente não entender essa história, não estudá-la, não saber o que veio antes, isso acaba ficando uma coisa sem importância. A memória tem que ser preservada e a história também, por uma questão de identidade. Você se vê naquilo ali. A sociedade sem história não é nada.
Qual o foco dos estudos do museu?
O que o museu pretende é contar a história do desenvolvimento de Maringá. Vai falar desde a criação de Maringá, provavelmente da sua pré-história, já que esse lugar foi habitado por vários ancestrais, os indígenas e colonos que também passaram por aqui. Iniciamos desde lá na época da Companhia Melhoramentos [Norte do Paraná], os desbravadores, enfim, a questão econômica, o desenvolvimento industrial.
Quanto aos projetos, o que a senhora espera e quais as contribuições que as pesquisas acadêmicas podem trazer para o museu?
São dois projetos distintos. A respeito dos pioneiros é um projeto de pesquisa docente, ligado à diretoria de pesquisa do Cesumar, e nesse projeto pretendemos levantar a história de cada pioneiro que é nome de rua em Maringá, nele estão envolvidos os alunos do 2º ano de jornalismo. O outro projeto é, na verdade, um grupo de pesquisa que está sendo formado por mim e pelo professor Selson Garuti e pretendemos desenvolver a pesquisa a respeito do campo religioso da região de Maringá e eu espero bons resultados, eu acho [risos]. Eles serve como material para próximas pesquisas, servem como fonte de pesquisa. O museu não será apenas um local para as pessoas visitarem e verem a história. O grande projeto é que o museu se torne um centro de pesquisa também, um local onde se possam desenvolver outras pesquisas. Então, vai ser um espaço didático-pedagógico também.
Sobre a infra-estrutura. Como está o andamento das obras e como será a estrutura visual?
Se você passar por lá vai ver uma casinha de madeira. Uma casa que estava no centro da cidade, foi trazida para cá e reconstruída da mesma forma. Naquele espaço vai ser repetido, digamos assim, o cotidiano da vida do pioneiro, como ele vivia, o que ele fazia, enfim, isso na parte externa. E na parte interna vai ser criado todo um ambiente de uma vida no campo. [O visitante] Vai poder observar todo o desenvolvimento da cafeicultura até a colheita, os instrumentos de trabalho, os meios de transporte que eram usados, a horta, o poço, o banheiro, jardim, galinheiro, toda essa estrutura que vai mostrar como era a vida desse colono, desse trabalhador. E na parte grande, de alvenaria, vamos ter um museu que vai utilizar uma tecnologia de ponta para contar essa história de Maringá.O visitante vai ter essa história contada em vídeos, mas de forma dinâmica, moderna, usando recursos digitais para essa apresentação.
A senhora coordenou, recentemente, a publicação de uma revista histórica em comemoração ao aniversário da Igreja Presbiteriana Independente de Maringá. Como foi essa experiência e no que isso pode contribuir para a história da cidade?
Eu fui convidada para fazer parte da revista, e fui com muita alegria fazer parte dessa comissão, mas quando eu percebi tinha feito toda a revista, porque me envolvi e a coisa foi contagiando. São fatos novos mas, pelo fato de eu já ter feito isso, naveguei com certa facilidade sobre esse assunto. Foi uma experiência muito boa. É claro que as críticas existem, a partir do momento que você publica algo está dando a cara a tapa, se torna visível, mas ate mesmo as críticas fazem parte do processo. O interessante foi que eu viajei para entrevistar o primeiro pastor da igreja e foi ele que me batizou quando criança. Foi muito emocionante, eu chorei muito, ele e os filhos também. Nos emocionamos muito, mas eu consegui fazer a entrevista. O que me deixou triste, mas ao mesmo tempo impressionada, foi que este ano ele faleceu, mas penso: “nossa que bom que eu consegui falar com ele a tempo, antes dele partir.” Foi tudo muito bom.
Quanto ao resgate da história, o que a senhora espera para o futuro?
O grande sonho que eu tenho com o museu e que ele seja efetivamente transformado em um espaço de aprendizagem. Não ser apenas bonito, interessante e moderno mas que gere no visitante esse gosto pela preservação da memória, da história. E quando eu penso em transformá-lo em um lugar de pesquisa é para que os estudantes aprendam ao caminhar pelo museu. A pesquisa faz parte do processo da aprendizagem mesmo. Sem ela a aprendizagem fica no nível da decoreba.

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