quarta-feira, 20 de outubro de 2010

“A construção da paz deve ser coletivamente”

Leilane Wesselovicz, coordenadora da Pastoral da Criança de Maringá, relembra exemplos de Zilda Arns no trabalho voluntário
Alisson Gusmão
Foto: Drika Favoreto
Foi no horário do almoço, com o típico vazio no estômago e em um dia chuvoso de outubro que a reportagem do jornal Matéria Prima chegou à casa onde está instalado o escritório arquidiocesano da Pastoral da Criança. O objetivo não poderia ser outro: uma entrevista com a coordenadora do movimento, Leilane Rodrigues Garnica Wesselovicz.
O caminho foi tranqüilo. Vários trabalhadores se dirigiam a seus lares ou restaurantes para arrebatar o momento tão aguardado durante toda a manhã. Para não errar, o repórter carregava o mapa das ruas em mãos. Passou pelo cemitério, virou à direita, deu algumas voltas, errou a rua, retornou e, enfim, encontrou o prédio procurado.
Foi só entrar na casa e já era notável a presença das pessoas que dedicam parte do tempo ao próximo: as voluntárias. Elas esperavam pela mesma pessoa: Leilane Wesselovicz, 49, coordenadora arquidiocesana da Pastoral da Criança. O motivo era outro, parabenizá-la pelos anos que completava naquele mesmo dia.
Bastou perguntar pela coordenadora que, com o sorriso de uma das secretárias, veio a resposta: “ela já vem”. Também com um sorriso estampado no rosto, a entrevistada chegou convidando o repórter para almoçar. Foi irresistível! Logo após o almoço e aguardados alguns minutos, suficientes para fazer novas amizades, Leilane, inquieta e animada, começava a responder as primeiras perguntas.
A Pastoral da Criança é um movimento de ação social ligado à Igreja Católica. Como funciona esse trabalho?
A Pastoral da Criança é um instrumento de promoção da vida, porque desenvolve um trabalho que leva a vida em abundância a todas as crianças. Esse trabalho é desenvolvido por líderes voluntárias que o fazem com dedicação, com amor. Elas vão de casa em casa e levam paz, amor e solidariedade a todas as famílias. Além das visitas domiciliares é realizada a celebração da vida. As líderes reúnem as crianças e além de orientar, fazem o trabalho com as mães. As crianças são pesadas para ver como estão se desenvolvendo. Também é desenvolvido um trabalho com gestantes, através de um grupo onde elas se reúnem e recebem informações sobre saúde, nutrição, educação e cidadania.
A senhora está há 22 anos na Pastoral da Criança. Começou como líder voluntária e já trabalhou em vários níveis de coordenação. Por que trabalhar nesse movimento?
A princípio, quando entramos na Pastoral da Criança, temos a ideia de ajudar ao próximo, levar qualidade de vida para as pessoas. Com o passar do tempo, percebemos que as maiores beneficiadas somos nós mesmas, porque ganhamos muito com isso. O fato de saber que estamos contribuindo para a qualidade de vida das famílias, para diminuir as injustiças sociais, as desigualdades, faz com que aumente a nossa auto-estima. É o amor!
Além de fundadora, quem foi Zilda Arns para a Pastoral da Criança?
Ela foi uma guerreira. Plantou uma sementinha lá em Florestópolis [distante 104 Km de Maringá] por conta do índice muito alto de mortalidade infantil, desenvolvendo ações simples, mas eficazes, que foram se multiplicando pelos outros municípios, Paraná, Brasil e hoje está em 21 países. É uma guerreira que realmente promoveu vidas pelo mundo todo. É um exemplo de mulher.
Ela [Zilda Arns] estava em missão no Haiti, quando foi soterrada no terremoto de 12 de janeiro. Qual era essa missão no país e como foi receber a notícia do desastre?
A missão dela seria implantar a Pastoral da Criança lá também e, infelizmente, no momento em que ela estava dando uma palestra, foi ceifada por esse terremoto. Quando a gente fala da doutora Zilda nos emocionamos porque realmente ela [pausa], nos dava segurança. Eu tive a oportunidade de recebê-la aqui, enquanto coordenadora da Pastoral da Criança, quatro vezes na minha gestão. Era uma pessoa iluminada, uma pessoa que você não via séria nunca, sorria o tempo todo. Transmitia muita paz, muita segurança, muita força. Quando ela vinha a Maringá, elevava a auto-estima das líderes, motivava o trabalho mais ainda. A princípio, quando veio a notícia do falecimento dela, nós ficamos bem desanimadas e, no primeiro momento, até pensamos que o trabalho poderia realmente diminuir, mas  percebemos que isso acabou nos dando uma força maior ainda.
Em Maringá, quais são as metas e os obstáculos que a senhora encontra?
Nós acompanhamos aqui na Arquidiocese de Maringá mais de 14 mil crianças. São 28 municípios e 57 paróquias. Acompanhamos apenas 40% das crianças pobres, enquanto 60% estão descobertas. Um dos entraves é esse: a falta de lideranças, de voluntárias para que a gente possa atingir 100% das crianças acompanhadas. Infelizmente o voluntariado hoje está difícil, porque alguns anos atrás as mulheres não trabalhavam fora. Hoje, a realidade é outra, as mulheres vão trabalhar para ajudar no orçamento familiar, mas mesmo assim, aquelas que trabalham fora, que têm outras atividade, continuam com menos intensidade. Menos famílias acompanhadas, mas continuam. Antes eram muito mais líderes que conseguiam acompanhar um número maior de crianças.
A senhora consegue desenvolver todos os trabalhos da Pastoral mesmo com a equipe pequena?
Conseguimos. Todas as ações propostas pela coordenação nacional desenvolvemos aqui, inclusive, agora em Maringá, vai ser implantado um projeto piloto para o Brasil inteiro, vai ser modelo. Maringá e Foz do Iguaçu são as duas cidades piloto que vão desenvolver esse projeto. É em relação à obesidade, porque trabalhamos muito com a desnutrição que ainda hoje existe, mas com uma porcentagem bem pequena. A maior preocupação agora é com a obesidade. Temos percebido que as crianças estão com problemas sérios de saúde por conta , infelizmente, da má alimentação.
O que a senhora espera para o futuro da Pastoral da Criança?
Acredito que é importante que possamos atrair mais voluntários, porque é um trabalho muito gratificante, que nos traz satisfação enorme. A construção da paz deve ser coletivamente, com as atitudes e práticas do bem comum. Se todos nós nos juntarmos para desenvolver um trabalho, por pouco tempo que seja, vai se transformar em um grande trabalho e, com isso, vamos diminuir as desigualdades sociais e promover a justiça social. 

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